Homenageada do Prêmio Extra 2016, Gloria Pires reafirma seu amor pela TV: ‘Sempre foi minha prioridade’


Dama da TV, profissional respeitadíssima, mãe exemplar, mulher admirável... Ela é, reconhecidamente, a glória! Motivos, portanto, não faltam para celebrá-la. O Prêmio Extra de TV 2016 dá início às comemorações pelos 45 anos de carreira de Gloria Pires, que se lançou como atriz nos primeiros meses de 1972, num “Caso especial” e na novela “Selva de Pedra”, ambos na TV Globo. A festa que a homenageará tem patrocínio da Casa & Video e apoio dos Supermercados Guanabara e vai acontecer na próxima terça-feira (29), no Vivo Rio. Já emocionada, Gloria diz que só quer agradecer quando chegar a sua hora de subir ao palco: 

— Preciso encontrar uma maneira sucinta de dizer o quanto sou grata por tudo o que me aconteceu, porque detesto longos discursos. E que seja relevante e inspirador para quem estiver assistindo. Tenho tanto a agradecer... 

Com o pai, Antonio Carlos, num humorístico

Quem são os responsáveis por Gloria Pires ter chegado até aqui? 
Primeiro, os meus pais, que me guiaram nos altos e baixos, puseram meus pés no chão e alertaram: “Calma, a tempestade não dura a vida inteira. Tenha paciência, você vai chegar lá!”. Depois, a classe artística, que me recebeu com carinho; a Globo, que acreditou no meu talento e no meu empenho; e esse público tão fiel, que me presenteia até hoje. Sou grata até não poder mais. 

Eduardo Nassife, um dos autores do livro “40 anos de Gloria”, disse que sua trajetória é a da “menina que nasceu pobre, foi desacreditada num teste de novela e hoje é uma das maiores atrizes do mundo”. Isso resume a sua história?
“Do mundo”? Isso é coisa de fã... (risos). Mas, sobre pobreza, sou filha de artista (do ator Antônio Carlos Pires e da produtora e empresária Elza Pires), né? Então, era uma vida muito inconstante, entre Rio e São Paulo. A gente ia para onde tivesse melhores condições de trabalho. Essas mudanças me ajudaram a adquirir uma flexibilidade perante a vida. Mas fui criada num ambiente leve, sem assuntos proibidos. Drogas, sexo, religião, política... O que viesse à mesa era conversado. 

Gloria em cena do “Caso especial”, seu primeiro trabalho como atriz, em 1972

Curiosamente, você nasceu em 1963, ano da primeira telenovela diária, “2-5499 ocupado”, e sua carreira ficou muito ligada à TV, às novelas... Acredita em destino? 
Essa coincidência é bem interessante! Assim como a história do meu nome. Minha mãe teve uma gestação difícil. Ela fraturou três vértebras da coluna e não sabia que estava grávida. Então, precisou ficar de repouso até os 8 meses, quando puderam fazer a cesariana. Eu iria me chamar Maria Claudia, mas, como eles foram parar no Hospital da Beneficência Portuguesa, na Glória, e era mês de Nossa Senhora da Glória (agosto), tudo contribuiu para o Gloria vir para a frente do meu nome. Ficou Gloria Maria Claudia Pires. 

Sua primeira aparição na TV foi na abertura de “A pequena órfã”, da TV Excelsior, em 1968. Logo no primeiro teste como atriz, para “O primeiro amor” (1972), na Globo, foi reprovada. Foi traumatizante? 
Durante muito tempo na minha vida ter sido rejeitada pelo Daniel (Filho, diretor) foi uma questão (na época, ele lhe disse que queria uma menina “mais bonitinha” para o papel). Eu me lembro de ter chorado muito, muito mesmo. Só curei isso quando fui selecionada num outro teste, com o mesmo Daniel, para “Dancin’ Days” (1978) . De alguma forma, ali, houve esse resgate, eu me fortaleci. Foi como se eu dissesse: “Vamos começar de novo?”.

A atriz em sua estreia em novelas: a Fatinha de “Selva de Pedra”

Mas era um sonho ser atriz? 
Que nada! Sofri a infância toda. Eu era muito insegura da minha capacidade, por mais que meu pai me incentivasse. Para mim, era um estresse violento, de a boca secar, o coração entalar na garganta. Nunca vou me esquecer dessa sensação. Mas eu me sentia impelida a fazer aquilo, resistir, vencer, não aceitar a condição de derrota. 

Na infância, você participou de vários programas de humor ao lado de seu pai. Já adulta, esse lado mais cômico acabou sendo pontual. Achava difícil fazer rir? 
Não sei porque minha carreira não pendeu para o humor. Fiz linha de shows bastante tempo e depois voltei para as novelas, para o drama. Mas eu gostava e gosto de fazer as pessoas rirem. Na vida, sou muito bem-humorada. Embora não fale muito, sou engraçada, adoro surpreender. Bom humor na vida é tudo! 

Com Sonia Braga em “Dancin’ Days”

O teatro também não aconteceu na sua carreira... Por quê?
Por pura falta de tempo. Sou contratada da Globo, então minha prioridade sempre foi a televisão, e é o que eu adoro fazer. Não conseguiria me dividir entre uma novela e uma peça. Admiro muito quem consegue essa façanha. Já me chamaram para fazer uns musicais, mas eu não fico criando expectativa, sabe? A hora que tiver que acontecer, vai acontecer. Meu mapa astral diz que eu vou viver muito. Então, ainda tenho muito tempo pela frente (risos). 

A TV sempre foi olhada pela pseudointelectualidade como uma arte menor. Ser considerada uma atriz popular pela carreira sólida neste veículo é motivo de orgulho? A visão que as pessoas têm sobre a televisão é de cada um. Mas ninguém pode negar que se fazem coisas de qualidade na TV. Tem coisas ruins? Tem! Assim como há livros e filmes ruins e bons. Eu amo o que faço. 

Com o diretor Daniel Filho, que marcou seus primeiros passos na carreira de atriz

O Brasil acompanhou todas as fases da sua vida. Isso a tolheu de alguma forma? 
O pior para uma pessoa tímida é ser vigiada, ainda mais por todo um país. Foi difícil. Mas nem por isso deixei de ter opinião própria. Houve uma época em que o Juizado de Menores me proibiu de dar entrevistas (risos). Já adulta, morar um tempo fora do país foi libertador (ela se mudou com a família em 1997 para Los Angeles e em 2008 para Paris). Era ótimo entrar num supermercado e ser apenas mais uma consumidora, passar despercebida. A falta de privacidade é a parte mais complicada da vida artística, mas achei uma maneira de lidar bem com todo tipo de pessoas, as bem e as mal-educadas. 

Pensou em consolidar uma carreira internacional?
Eu cresci assistindo às cerimônias do Oscar e aos musicais da “Sessão da tarde”. Meu sonho de carreira internacional era muito nessa estética dos anos 40 e 50, não era algo real, planejado. Minha carreira aqui no Brasil, desde muito cedo, foi definitiva. Eu me sentia responsável pelo que fazia, pela ligação com a empresa. Estive no Oscar quando “O quatrilho” (1995) concorreu, fiz o “Flores raras” (2013), primeiro trabalho todo em inglês, mas não passou disso. Ir morar de vez lá fora demandaria um investimento enorme.

Com Beatriz Segall numa cena de “Vale tudo”

Maria de Fátima, de “Vale tudo” (1988), foi um marco na sua carreira. Ela disputava maldades com Odete Roitman (Beatriz Segall), considerada a maior vilã de novelas de todos os tempos... 
Questiono muito esse título de vilã para as duas. Vilão é aquele que persegue o herói da história. Ali não existia uma perseguição, mas um confronto. Odete tinha um estilo de vida que justificava suas opiniões. Já Maria de Fátima era mau-caráter, isso sim. Mas nunca ninguém me xingou ou me bateu na rua por causa dela. 

Já “Mulheres de areia” (1993) deve ter sido o trabalho que mais te exigiu, por precisar se desdobrar em dois papéis, Ruth e Raquel... 
Ah, foi muito estafante! Antônia (filha) tinha 4 meses quando comecei a gravar a novela. Eu ia para Tarituba (em Angra dos Reis) com bebê, babá, berço... Não tinha folga. Num dado momento, minha mãe faleceu. Wolf (Maya, diretor) me deu cinco dias de descanso, e eu vou ser eternamente grata a ele por isso. Por outro lado, a empresa insistiu no meu nome para esse remake. Não sou de subir no palco nem de sentar no trono, mas eu me senti muito valorizada. Depois, ainda ganhei de presente “Memorial de Maria Moura” (1994), um dos meus trabalhos mais queridos. 

Em “Mulheres de areia”, a atriz se desdobrou nos papéis de Raquel e Ruth

Você é saudosista? 
Guardo coisinhas de alguns trabalhos... Tenho a capa e o chapéu de Maria Moura, um cordão com pingente de elefante do filme “Pequeno dicionário amoroso” (1997), um tailleur que usei em “Belíssima” (2005) e o vestido e o chapeuzinho de Nise da Silveira (do filme “Nise, o coração da loucura”, de 2015). 

Uma vez, você disse que não acreditava na sua beleza. Ano passado, no entanto, encarnou uma devoradora de homens em “Babilônia”. Como ficou a autoestima? 
Quando Beatriz surgiu para mim, eu já estava de bem com a minha vaidade. Consegui fazer uma mulher despudorada, como precisava ser. Esse papel veio na hora certa. Passei dos 50 e sou feliz do jeito que sou, com a vida que tenho. 

Gloria Pires em “Memorial de Maria Moura”

É bom ser exemplo em tudo? 
É bom, mas é uma responsabilidade. Acho que eu teria sido uma excelente militar. Para mim, ordem dada é ordem cumprida. De alguma maneira, vou dar conta daquilo. Sou supercaxias! Minha mãe era assim também. Quando eu estava doente, ela não aceitava que eu ligasse para o trabalho dizendo que estava mal. Tinha que ir pessoalmente ao Jardim Botânico mostrar que estava com febre, sem voz... Leleca (mãe) era terrível! Mas é importante ter respeito pelas coisas. Se você abraça uma profissão, tem que estar dentro daquela história até o fim, com os ônus e os bônus. Tem que aprender a lidar com as frustrações, se dar conta de que é humano e faz o seu melhor até onde dá. 

Mas houve frustrações, fracassos? 
Vejo o fracasso como algo que não trouxe experiências, que afundou. Tudo o que faz pensar, ir adiante, não é fracasso, mas erro. Aí sim tive vários, fazem parte da vida. Não tem que ter autopiedade. São esse tijolinhos que constroem a história, a autoestima. 

Com Thiago Martins em cena de “Babilônia”

Ela por eles 

“Gloria é minha grande parceira de vida, meu amor maior. A gente se casou para se fazer feliz. Criamos os filhos com muita liberdade e responsabilidade social, sem querermos parecer heróis. Ela é a melhor pessoa do mundo para se conviver. Tão inspiradora que ganhou várias músicas minhas.” Orlando Morais, de 54 anos, cantor e marido de Gloria há 28 anos. 

“Não a vejo como artista, mas como minha mãe. Quando eu era pequena, me incomodava o fato de ela trabalhar muito. Se estava com ela, queria só para mim. Eu não escolhi a mesma profissão dela, fui escolhida. Ela sempre respeitou minhas decisões.” 
Cleo Pires, de 34 anos, atriz e filha primogênita .

Com a filha Cleo Pires em 1987

“Ninguém é exemplar, e nem acho que se deva cobrar essa perfeição de mães, pais ou filhos. Tenho uma família de seres humanos, com erros, acertos e, acima de tudo, muito amor e admiração um pelo outro. É isso que nos une.” Antonia, de 24 anos, atriz e segunda filha. 

“O carinho que ela conquistou de todo mundo é lindo e emocionante. Todos os meu amigos amam minha mãe e se divertem com as gírias que ela usa, que eu adoro!” Ana, de 16 anos, terceira filha.

“Ela me catequiza, me acalma. É impressionante como ainda arruma tempo para cuidar dos amigos. E que profissional dedicada ela é! Tem um perfume para cada personagem que vive.” Antônio Padilha, de 55 anos, assessor pessoal da atriz há 26.

O casamento de Gloria e Orlando Morais

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